20 de março de 2010

Folhas de papel

Hoje acordei com uma dor estranha no peito. Não sei bem se "dor" é a palavra certa para aquilo que senti (e sinto, tantas outras manhãs).
Hoje, como ontem, acordei com uma sensação desagradável: uma espécie de arrepio incomodo que, a cada respiração prolongada, sobe até os meus olhos e os faz brilhantes. É um arrepio com um poder incrível! Traz-me recordações - vagas recordações - que ameaçam perder contornos. Vêm todas, em forma de desenhos, fechadas numa caixa escura, sem qualquer tipo de organização (crono)lógica. São só desenhos daquilo que vivi, desenhos daquilo que fui. Quando o arrepio (de poderes realmente incríveis) mos traz, eu estremeço. Fico assustada. Tenho medo. (Tanto!) Medo de ficar perdida dentro dessa caixa que me mostra, constantemente, que esta pessoa, acabada de acordar, não sou eu. É uma voz que grita de uma maneira tão forte que acabo por acreditar no que me diz: esta não sou eu.
Perco aquilo que me parecem horas a vasculhar em rascunhos: encontro as minhas pessoas e os meus lugares; encontro momentos de insignificante importância; consigo ver-me, a mim, presa nesses momentos - totalmente presa em histórias que já tiveram o seu fim. Sinto-me louca no meio de tanta confusão. Passam-se aquilo que me parecem horas até que me canso de lutar contra folhas de papel e respiro, encho o peito e encho o olhar.
Levanto-me, guardo os desenhos, calo a voz, fecho a caixa, escondo-a e saio à rua. Saio para uma rua esburacada que não é a minha. Custa-me o dia, passado nessa rua interminável que pouco me diz. Vejo pessoas. Consigo cheirá-las, consigo ouvi-las. Eu consigo senti-las, saber que também elas são minhas e fazem parte dos meus lugares - as minhas pessoas e os meus lugares de hoje. Se não fosse a outra voz... Se não fosse a outra voz (quase sempre) gritante, eu até saberia quem sou.
Ridículo. Ridículo este arrepio. Ridícula eu que deixo que ele me engane e me roube as certezas de quem sou.
Ridículo.